domingo, 3 de julho de 2011

Crianças do parquinho

Depois de cuidadosa consideração e muitas noites sem sono você descobre que não há nenhuma coisa tal qual o crescimento. Nós saímos do casulo, nós mudamos. Nós aprendemos com os nossos erros. (Nada mais eficaz do que aprender com os próprios erros). Olhamos com olhos sábios para quem fomos. Muitas vezes nos envergonhamos desse passado, mas é normal. Que mal tem em cheirar o próprio pum no sofá aos 9 anos de idade? É fase.

Cada dia é um aprendizado. Saimos com o guarda-chuva no dia nublado. Aprendemos o macete para se abrir vidros de palmito. Assimilamos a posição estratégica do absorvente na calçinha. Passamos a ser o porquinho que constrói a casa com cimento e tijolos. Nós pegamos o jeito.
Nós nos acostumamos com a dor e a acolhemos como uma velha amiga. Porque ela sempre bate à nossa porta, embora por diferentes motivos, ou talvez os mesmos motivos com uma nova roupagem. Nós nos tornamos íntimos da dor, aprendemos a conviver.

Maturidade é segurar a dor no colo.

Aprendemos, de alguma forma, a anestesiar os sentimentos. Você namora aquele par de sapatos da vitrine, mas consegue refrear o impulso de amaldiçoar a vida por não poder comprá-lo no momento. A paciência chega com o tempo. É como um copo que aumenta de volume com o passar dos anos. Pinga, pinga, inunda até a borda, mas não transborda.

Você não se acostuma com as perdas, você se conforma. Porque, de uma forma ou de outra, as coisas, pessoas, sentimentos, momentos que perdemos acabam sendo substituídos por outras coisas, pessoas, sentimentos e momentos. Tudo a seu tempo.

Maturidade é o olhar sereno de uma idosa.

Se você tem sorte, cura as feridas superficiais. Mas as inseguranças básicas, os pequenos medos e todas aquelas velhas e grandes feridas crescem conosco. Temos que lavar essas feridas e esperar um tempo... pra que se curem.

Mas, apesar de todo esse suposto controle da situação, o plano falha. É como a água que escorre por entre os dedos. De repente, não chove. O vidro racha. O sangue vaza. Esquecemos de esquentar a lareira. Você se pergunta "o que deu errado?". O manual de instruções se torna inútil e você sente o desejo de mandar o fabricante às favas. Mas cada caso é um caso. Precisamos permitir que o plano de nossas vidas assuma viradas inesperadas. Que a direção dos projetos que pensávamos ser estáveis sejam instáveis. Isso é entender o tempo.

Maturidade é fazer o bolo sem a receita.

Nós ficamos grandes, nós ficamos altos, nós envelhecemos, mas na maior parte do tempo somos um grupo de crianças correndo em volta do parque tentando desesperadamente ficar em forma. Quando tudo parece equilibrado, manso, intocável, a máscara cai e tomamos decisões desesperadas e/ou infantis. A nostalgia vence. Sentamos no chão da fila do cinema. Dançamos na chuva. Raspamos o pote de iogurte com o dedo. Guerriamos com bolinhas de catota. Dormimos abraçados com nossos velhos ursos. Passamos um trote mudos só para ouvir uma determinada voz. Nós quebramos as regras que fazemos para nós mesmos. Nós temos acesso de raiva quando as coisas não vão como queremos. Agimos como crianças cheias de gostos e birrentas de supermercado. Nós sussurramos segredos bobos pros nossos amigos. Nós procuramos conforto onde nós podemos achar. E nós desejamos ferrenhamente, mesmo indo contra toda a lógica, contra toda a experiência. Como crianças, nunca desistimos da esperança, dos sonhos. Os sonhos são como parte de nós. Viver sem eles é como guardar o braço na gaveta, esconder os olhos no porão, estender a perna no varal.

É possível crescer, mas eu nunca conheci alguém que realmente tenha feito isso.
As lições não se fixam de uma hora pra a outra. É um evento, grande ou pequeno, alguma coisa que muda a gente. Idealmente nos dá esperança, uma nova forma de viver a vida e de olhar o mundo. Desfazemo-nos de velhos hábitos, memórias antigas. Apertamos o botão F5 e, de repente, não somos os mesmos.
Mas no fundo, no fundo, sabemos que existem algumas coisas que valem àpena serem mantidas.

Porque ser maduro é permitir-se ser a borboleta
Sem deixar de revisitar o casulo.


Vanêssa Aulette

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